terça-feira, 17 de abril de 2018

Reflexão


 Máquina de lavar alma

“Máquina de lavar alma”. Li essa frase em uma revista de surfe há alguns anos. Ela era a legenda de uma foto: um surfista dentro de um tubo. A foto e a legenda resumem bem a sensação de um banho de mar.
mar_praia_oceano_criancasA sensação que tenho é que o mar proporciona um novo nascimento cada vez que entramos e saímos dele. Se a gente se permite, um mergulho no mar renova as energias, acalma, traz equilíbrio. É como se a água salgada me colocasse em conexão comigo e, logo, com Deus.
Dentro da água, todos as coisas ganham devida proporção. Monstros gigantes ficam tão pequenos que quase deixam de existir. Vitórias que, a princípio parecem pequenas, de repente nos invadem de felicidade, uma energia que preenche cada espaço da nossa existência.
O mar acaba proporcionando isso, um momento para relaxar, não pensar em nada e, ao mesmo tempo, pensar em tudo. Desligado do mundo, em meio às ondas, sem pretensão. É exatamente aí que a resposta inspiradora aparece.
Às vezes, a gente começa a meditar pensando na solução de um problema ou preocupado que aquela meditação traga uma ideia brilhante. Mas, normalmente, ao menos comigo, as respostas nunca aparecem quando meu foco é nelas. As boas ideias ou a solução de um problema aparecem quando relaxo. Justamente quando tiro meus pensamentos daquilo, mudo o foco.
Recentemente, li em um livro do indiano Osho que, quando meditamos, não devemos esperar nada, apenas a própria meditação em si. Simples e profundo. Isso me fez pensar sobre o mar e o quanto ele é um bom lugar para meditar.
É certo que há muitas formas de meditar. Cada um tem a sua maneira de encontrar-se.  Uma boa noite de sono, um bom banho, uma boa música. De qualquer forma, Osho tem razão sobre o método. Ainda que não seja fácil colocá-lo em prática, ter consciência disso é um bom começo.
Sobre o autor: Rafael Miramoto, 30 anos. Alguém que gosta de estudar, refletir e compartilhar.



“Ensaio sobre a cegueira”, a lucidez e a esperança


livro
(…) a cegueira também é isto, viver num mundo onde se tenha acabado a esperança, “Ensaio sobre a cegueira”, José Saramago
A metáfora de uma cegueira que não é física, mas da alma. E que, no fundo, é a pior cegueira que pode existir. Foi por essa reflexão de beleza sublime que me senti conduzido por Saramago em “Ensaio sobre a cegueira” (Companhia das Letras, 1995).
Preservar o belo dentro de uma representação trágica é, certamente, a expressão de um talento que se conecta com Deus. Saramago tem o belo dom de ajudar seu leitor a pensar com a alma partindo de uma dor que atinge o físico. Minha leitura é de que cada um daqueles personagens centrais representa um traço da personalidade humana. É como se todos eles reunidos formassem um único homem ou mulher.
A narrativa é permeada por frases e expressões sutis e profundas que nos levam – quase que pelas mãos – a uma reflexão para além das páginas. Como o pai que segura o filho pelas mãos e o ensina a atravessar a rua, numa simples e profunda demonstração de amor. Tudo isso com uma construção literária muito própria de Saramago.
Felizmente, como a história humana tem mostrado, não é raro que uma coisa má traga consigo uma coisa boa, fala-se menos das coisas más trazidas pelas coisas boas, assim andam as contradições do nosso mundo (…), “Ensaio sobre a cegueira”.
Ler Saramago é como olhar a Mona Lisa de da Vinci em busca dos segredos que há nos detalhes por trás daquela pintura. A gente nunca sabe onde estará a próxima pérola. Em meio a um diálogo ou a uma discussão, Saramago nos lança uma frase chave. É como se o livro fosse apenas um pretexto para aquela única frase. A verdadeira essência da mensagem.
O livro poderia terminar naquele exato momento. Mas, como você sabe que ainda há páginas pela frente, segue a leitura ansioso pelo próximo presente de Saramago. A próxima pérola que nos aguarda.
“Ensaio sobre a cegueira” é, definitivamente, um livro sobre vida. Um ensaio sobre recobrar a lucidez, elevar e iluminar a consciência e manter viva a esperança mesmo em tempos sombrios.
Um livro sobre o quanto somos muito mais fortes do que imaginamos. Sobre o quanto somos capazes de nos superar e de sermos fratenos com nossos “irmãos”. De como podemos ser bons e maus. E sobre quanto o medo funciona como ferramenta de dominação se nos deixamos paralisar por ele.
Quando o livro termina, só resta dizer: Obrigado, Saramago.
Sobre o autor: Rafael Miramoto, 30 anos. Alguém que gosta de estudar, refletir e compartilhar

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